O valor de JoJo

Não, você não leu errado. Eu resolvi fazer um post logo de JoJo aqui, e não, isso não vai ser um post chupando o Araki e forçando que JooJ é uma absoluta mestre peça. Só resolvi fazer esse post pra tentar responder um questionamento que o Alexandre Esteves colocou em pauta num vídeo dele aí.

Por mais que a opinião dele em relação a JooJ gere mil controvérsias e muita discussão por aí, eu não vou fazer parte do bonde e fazer uma resposta contra argumentando com cada coisinha que ele diz nos vídeos, eu vou fazer algo diferente.

"Então por que caralhos você resolveu fazer um post resposta a ele?"

Bem, isso é uma ótima pergunta, e a resposta é que isso não é necessariamente uma resposta argumentativa com o intuito de desbancar oque ele fala, na verdade isso daqui é pra responder um questionamento dele, esse sendo: Por que JoJo deixa esse "efeifo" na gente? Por que JoJo é tão diferente a ponto de não ter nada realmente parecido?

E sinceramente, esse é um questionamento muito bom que eu e muita gente já fizemos. Mas eu nunca realmente liguei porque eu sempre imaginei que isso era um produto dessas pessoas gostarem bastante, e por JoJo ser naturalmente mais extravagante e bizarro que o resto dos mangás que tem por aí o pessoal acabava tendo mais meme material pra ficar revisitando a obra constantemente. E isso até que não seria uma resposta ruim, mas aí que tá: O Alexandre não gosta de JoJo

"Mas e daí? Então ele tem essa sensação pelos memes"

E sinceramente, eu duvido bastante. JoJo é um meme ambulante, mas sinceramente os memes de JoJo não são muito diferentes do resto dos memes que tu veria, e ainda assim é bem complicado algo tão massivo quanto JoJo se sustentar inteiramente por causa disso, e perdurar por tanto tempo na internet unica e exclusivamente por isso. Eu imagino que a razão de JoJo "conquistar" as pessoas desse jeito não é algo tão externo quanto a fanbase ou os memes, mas sim alguma coisa intrínseca a obra em si.

"Não seria simplesmente por que é bizarro e chamativo?"

Isso é uma boa maneira de se olhar, mas é meio que simples demais, é uma resposta bem simplificada e vaga, até porque o conceito de bizarrice em si é meio abstrato.

"Então... o que é? O que é que faz JoJo infectar a sua última célula cerebral?"

Não se preocupe. Eu, Otenko o fodão, irei desenvolver uma tese científica que irá finalmente responder esse questionamento  de uma vez por todas!

Ou não. Que é o cenário mais provável, inclusive. 

(E esse post tem spoilers até a parte 6)

O modo que o Araki escreve

Sabe, JoJo é bem infame por diversos momentos conhecidos como "Araki Forgot", tipo o famoso plot hole do caixão ou certos plot points abandonados tipo os poderes vampiricos do DIO, e chega num ponto que acabou virando um meme bem recorrente na fandom e também alvo de várias críticas, tipo as do Alexandre mesmo. E por mais que isso pareça simplesmente estúpido, eu diria que isso é algo que afeta bastante nesse quesito que a gente tá discutindo. Uma vez eu vi o Oceaniz dizer em um vídeo que oque tornava a escrita do Araki tão legal era o quanto o Araki não tinha medo de "trocar as engrenagens" e mudar o rumo da obra, removendo e adicionando coisas espontaneamente. Embora eu discorde que isso seja uma qualidade positiva, isso é algo que é inegavelmente interessante.

"E daí? Vários autores fazem coisas desse tipo e constantemente esquecem coisas e abandonam ideias"

Sim, mas o Araki faz isso a curto prazo, e muito constantemente. Se você for olhar algo como Naruto, você vai ver que o Kishimoto esquecia de umas coisas esporadicamente aqui e ali, e as vezes metia uns retcons, tipo o retcon das bijuus serem conscientes, e inclusive ele botou todo o seu potencial de retcon durante a Guerra Ninja, e deu o seu melhor pra inserir plot points que surgiam e sumiam do nada, mas ainda assim isso é diferente do que o Araki faz. 

Durante JooJ inteiro você vai ver esses momentos de "Araki Forgot", muitos dentro de uma única parte, você desesperadamente vai ver jojofag simplesmente aceitando que é assim e zuando, ou jojofag colocando o seu corpo e alma pra tentar provar que o DIO simplesmente tinha dois caixões, e eu imagino que nenhuma dessas atitudes esteja certa. Eu vi uma série bem interessante por um YouTuber que eu esqueci o nome que se chama "Debunking Araki forgot", e embora eu não concorde com umas coisas, essa série transparece que muitas situações onde o pessoal assume que o Araki simplesmente tacou o louco são simplesmente falta de atenção. E isso reforça muito bem aquilo que o Oceaniz diga, não que eu ache que coisas como o plot hole do caixão sejam justificáveis, mas o ponto aqui é que até um certo parâmetro, o Araki tá realmente prestando atenção no que tá fazendo, porém ele simplesmente não liga de sacrificar coesão pra poder fazer aquilo acontecer. O próprio plot hole do caixão é um ótimo exemplo, o plot hole do caixão é algo tão estúpido que eu realmente duvido que o Araki simplesmente esqueceu de um detalhe tão crucial assim, e quando eu analiso o contexto de Stardust Crusaders, isso fica ainda mais evidente. Stardust Crusaders é acima de tudo uma parte experimental, a introdução de stands foi experimental, a narrativa focando em toda uma crew é experimental, e por aí vai. O Araki não ligou de simplesmente jogar o hamon pra escanteio e colocar stands no lugar, ele não ligou em abordar oque aconteceu com o resto da tribo de hamon, ele não ligou em simplesmente fazer o DIO deixar de usar os seus poderes vampiricos pra ficar brincando de boneco com um adolescente rebelde de 17 anos. A parte 3 queria focar em stands, então o Araki simplesmente enfiou hamon no cu, e ele simplesmente fez o DIO não usar os poderes de vampiro porque ele queria focar no The World. E seguindo essa lógica eu não duvido que ele simplesmente fez o DIO voltar apesar do caixão já ter sido usado pela Erina.

Se você não acredita nesse raciocínio, é só olhar pro contraste gigantesco de ambientação entre cada parte, Diamond is Unbreakable, Vento Aureo e Stone Ocean acontecem uma do lado da outra e todas são ridiculamente distintas, Vento Aureo não é algo que serve como uma transição de DiU pra Stone Ocean e nem algo do tipo. 

O Araki põe tudo que chama o interesse dele. Se ele leu em um livro como o sistema respiratório de um falcão funciona, você pode apostar que ele vai colocar lá, se ele leu uma frase do escultor Michelangelo que dizia que o escultor simplesmente revela o destino das rochas que ele esculpe, você pode apostar que ele vai colocar lá! E por aí segue.

O Araki é o cara que simplesmente matou todos os protagonistas de Stone Ocean, apesar do Giorno poder ser facilmente convocado ali, dado que o Pucci buscava todos os filhos do DIO e ele inclusive foi mencionado. Ele cagou pro Giorno porque se o Giorno estivesse presente ali, o Pucci seria derrotado, e isso é algo que o Araki não queria. O Araki é o cara que simplesmente escreveu a bakstory mais absurda de todas pro Diavolo, ignorando o fato dela não fazer sentido algum simplesmente porque ele queria que o Diavolo fosse uma contradição ambulante, ele não queria que a backstory do Diavolo fosse misteriosa, ele queria que ela fosse confusa pra um caralho.

"Mas qual o problema da backstory do Diavolo? Muitas obras usam esse tipo de recurso para serem mais abstratas e desorientadoras"

Exatamente, mas o lore do universo de JoJo é algo levado a sério, e é constantemente explicado, mesmo que de forma fudida mas é explicado. E esse é o ponto. De fato o lore de JoJo é assim mas o Araki não se importou em abrir uma exceção pra fazer justamente essa backstory pro Diavolo. O Araki constantemente escrevia diversos mangás pra expressar um conjunto de ideias, seja em forma de Gorgeous irene ou Baoh. Mas depois que o Araki criou JoJo, ele não fez mais isso, ele optou por continuar estufando inúmeras ideias dentro da mesma obra. Vento Aureo é uma parte que poderia ser facilmente uma história desconexa, se não fosse pela conexão sanguínea do Giorno e pelo epic comeback do Polnareff, e claro, diversas similaridades em coisas como o battle system e a ambientação, mas o Araki quis fazer ser uma parte de JoJo, ele quis colocar o fodendo Gold Experience Requiem pra simplesmente deixar ele não fazer mais nenhuma aparição.

E isso basicamente resume o jeito que o Araki escreve, ele adora colocar tudo que chama o interesse dele, ele adora colocar tudo que ele ache que vá ficar interessante. Eu não tô aqui pra dizer que tais escolhas são boas ou ruins, mas eu tô aqui pra transparecer que independente do que você pense sobre a qualidade de JoJo, essa é a maneira que o Araki pensa, e essa é a maneira que ele se expressa em JoJo. Ele homenageia as músicas que ouve, os filósofos que admira, os livros que lê, os filmes que assiste e por aí vai. Por mais que JoJo seja extravagante, bizarro, fora do normal, e fantasioso pra um caralho, ainda é uma obra extremamente íntima e pessoal.

A arte e a influência da David Productions

Ninguém precisa prestar muita atenção pra ver que a arte de JoJo é MUITO diferente do que você normalmente iria encontrar no meio de uma Shounen Jump da vida, e até no conjunto da vasta indústria de mangás, além da imagem específica que é battle shounen. Mas isso não se deve apenas ou traço ou as poses, mas sim algo a mais.

Sabe, os personagens de JoJo tem designs muito extravagantes e chamativos, e isso até que é comum nesse meio, mas JoJo é até demais. O design dos personagens de Vento Aureo é um ótimo exemplo, o Giorno simplesmente tem rosquinhas no cabelo e um decote em formato de coração no meio do peito e ninguém da uma foda, o Abacchio tem um ovo na cabeça e um cinturão com um "A" pendurado na roupa e ninguém da uma foda. Esses designs simplesmente transcendem a narrativa e ninguém aponta como a gangue do Bucciaratti claramente não tá usando uma roupa que permita um fácil infiltração, e tudo bem, já que o Araki prefere fazer que a obra não seja self aware em relação a isso. Mas é algo bem interessante, você ver os personagens usando essas roupas como se fossem a sua vestimenta de dia a dia, sendo bem flexíveis em combate apesar do quão inconfortáveis elas pareçam, você vai ver os personagens usando esaas roupas em momentos emocionantes, e as vezes até morrendo com essas exatas roupas. 

E isso complementa bem oque eu tenho a dizer quanto as poses, todo mundo sabe que JooJ tem poses, e eu não preciso repetir oque todo mundo já diz. Mas novamente, elas parecem ser bem desconexas da narrativa, é perfeitamente normal personagens posarem epicamente(as vezes até em momentos bem sérios) e ninguém apontar isso. E novamente essa desconexão que a arte tem com o plot fica evidente. E isso é algo bom porque significa que o Araki é totalmente livre pra criar as coisas mais absurdas visualmente e simplesmente inserir elas lá sem precisar de qualquer explicação, ele simplesmente bota lá, igual como ele simplesmente bota oque ele quiser botar na narrativa.

E com isso dito, eu vou precisar fugir do mangá a partir de agora, já que eu imagino que oque tinha pra cobrir no mangá eu já cobri. Agora eu vou falar de coisas que ficaram mais destacadas ou são exclusivas pro anime, então é isso.

JoJo só realmente bombou aqui no ocidente graças ao anime, e eu entendo perfeitamente o porquê. Embora JoJo já tenha tido seus OVAS tragos pra cá, os OVAS sacrificaram bastante da "essência" de JooJ em prol de uma atmosfera mais grimdark, se isso foi bom ou ruim, vai de cada um, mas a questão é que JoJo nunca tinha mostrado a sua forma final aqui. Depois que o anime chegou, JoJo foi crescendo bastante, e eu entendo perfeitamente já que a David Productions adaptou o mangá muito fielmente e conseguiu conservar tudo de esteticamente apelativo em JooJ MUITO bem. Algo bem visível pela estética e pacing mangalescos do anime, há shots do mangá recriados e quase que pausados enquanto efeitos seletos se movem e os personagens dialogam é são bem comuns, e embora eles pareçam uma ideia muito estúpida, eles funcionam que é uma beleza, e transcrevem muito bem os diálogos expositivos que tão entupindo a obra. Pessoas constantemente fazem piadas sobre como o time stop do DIO dura apenas 5 segundos mas ele passa muito mais tempo que isso soltando monólogos e se movendo lentamente, mas isso é um produto do que essa direção proporcionou, quase que não se importando em adaptar os painéis do mangá em tempo real e prezando mais uma experiência pausada e analítica. E é notável também como essa adaptação brincou com o estilo do Araki, trocando completamente a paleta de cores do ambiente e dos personagens em diversos cenários, que é um bom callback pra como os personagens de JoJo não tem uma paleta de cores definitiva, e ela varia bastante de desenho pra desenho, como nos covers por exemplo.

 Porém a David Productions não se limitou apenas a isso. Ela deu uns passos além... 

A David Productions expandiu a experiência de JoJo com os efeitos sonoros e a trilha sonora, embora os da Parte 1 e 2 sejam bons, e os voice actors captem muito bem alguns diálogos bizarros colocando uma performance igualmente bizarra e exagerada por cima convenhamos que a partir de Stardust Crusaders que as coisas ficaram REALMENTE interessantes. As barrages de ORA ORA ORA ficaram cheias de vida graças a performance de um voice actor, os socos foram acompanhados de um SFX bem peculiar que indica ser alguma modificação dos sons de uma arma atirando, e tudo isso acaba se complementando de um jeito interessante e fazendo algo tão básico quanto uma barragem de socos parecer bem única. E eu não preciso nem falar da trilha sonora que é simplesmente absurda, é uma mistura bem grande de estilos que eventualmente vão e se ramificam mais ainda nas partes posteriores, Vento Aureo tem fodendo ópera italiana de um lado e um tema hype pra caralho com direito a guitarra, baixo, violinos e uma voz cantando "JOJO" e logo em seguida "GOLDEN WIND". E do outro lado tem uma OST que tem muitos SFX de fitas VHS, e reprodutores de som, com direito até a estática. 

A David Production parece entender quase que perfeitamente a visão do Araki, e expande ela de maneiras muito naturais. E por mais que deixe a desejar pra muitos, eu realmente duvido que algum outro estúdio combinaria tão bem com JoJo.

Então, qual o valor de JoJo?

É bem difícil definir exatamente mas, eu diria que é a intimidade, variação e experimentação. 

Não sei se alguém concordaria comigo mas é isso aí, talvez o texto tenha simplesmente ajudado a pessoa a desenvolver uma resposta por si mesma e isso daí honestamente seria foda pra cacete. Mas então é isso aí. Fiz esse post pra tentar responder isso, e se esse post conseguir expandir essa discussão de alguma forma, vai ser bem daora mesmo, então espero que isso tenha sido útil pros 0 leitores.

E well, eu escrevi um puta texto sobre JoJo e talvez eu deva ponderar oque raios eu tô fazendo com a minha vida, mas, eu acho que isso totalmente valeu a crise existencial. Eu sou o Otenko e eu vou ver uma compilação de memes com o piano do Giorno.